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- Informe APC/SBPC-PE #1
- FACEPE: HISTÓRIA A SER CONTADA
Abraham B. Sicsú (APC, cadeira #21)
Uma Instituição que comemora seus 30 anos por quase dois anos tem algo de especial. Desde dezembro de 2018, até fins de 2020, ocorreram as comemorações da Fundação de Amparo à Ciência e Tecnologia de Pernambuco-FACEPE. Quando tinha acabado de completar 29 anos, constituiu-se um grupo de trabalho para as festividades. Encerra-se com um webinário em novembro e dezembro de 2020, poucos dias antes de completar 31. O que me lembro para contar segue no texto.
Quando da volta de Dr. Miguel Arraes de Alencar a Pernambuco, após exílio, em 1986 ou 87, foi constituído um grupo de trabalho coordenado pelo Professor Sérgio Resende, do qual tive a honra de participar, para elaborar a proposta de Plano de Governo, caso ganhasse a eleição. No documento final, três propostas constituíam a base institucional: a criação da Secretaria de Ciência e Tecnologia, a estruturação de um Fundo específico e a criação de uma Fundação de Amparo à Ciência e Tecnologia, nos moldes da de São Paulo.
A Secretaria foi criada, tendo Jáder de Andrade e Lúcia Melo à frente. Com o auxílio de Marcuscchi, comandando a SBPC Regional, e forte apoio da comunidade científica, criam-se condições para ter aprovada na Assembleia Legislativa, as bases da Fundação de Amparo, lançada em final de dezembro de 1989. As promessas são cumpridas. Sua primeira Diretoria, Sebastião Simões, Sérgio Resende e Emília Dias, dão o rumo do que se quer: Ciência e Tecnologia apoiando o Desenvolvimento de Pernambuco. No Governo de Carlos Wilson, Lúcia Melo assume a Secretaria e se começa a estruturar o trabalho.
A primeira sede é nas dependências da Fundação Instituto de Tecnologia de Pernambuco- ITEP, em umas salinhas cedidas no prédio anexo. Na época, eu era Presidente do Instituto. Reuniões intermináveis se desenvolviam para discutir quais os rumos a serem adotados, que instrumentos deveriam ser priorizados e, principalmente, como começar a cumprir a missão do órgão com um orçamento bastante limitado. Muitas foram as decisões tomadas, mas, quero lembrar, que, desde o início, o compromisso com o processo de desenvolvimento do Estado, foi priorizado. Foram criados programas setoriais que se baseavam nas prioridades que se tinha para a inserção da sociedade pernambucana. Não só instrumentos de apoio à comunidade científica, a preocupação de que a comunidade acadêmica desse seu contributo em áreas chaves se fez presente.
Outro ponto a destacar nos primórdios foi a busca da sede. Uma luta encabeçada por Lúcia Melo, concretizada com o casarão da rua Benfica, cedido em comodato pela UFPE.
Duas falácias sempre são ditas pelos contemporizadores de plantão: nunca houve descontinuidade e sempre teve apoio. Não é bem assim.
A FACEPE é um órgão do Governo Estadual. E, por isto, sujeita a ingerências e desestruturações. Seria ingenuidade acreditar que pressões não ocorreram, que não esteve submetida às mesmas restrições dos demais organismos. O Decreto de criação não deixou clara a vinculação de recursos para a instituição. Com isto, o planejado foi muito diferente do executado. Também, houve gestões que atendiam a interesses corporativos ou mesmo que foram utilizadas para resolver problemas reais do Governo Estadual, mas que não eram próprias para a Fundação, como, por exemplo, usar os mecanismos da FACEPE para contratar pessoas para outras áreas. Dificuldades várias devem ser notadas nesse caminhar.
O segundo Presidente, para mim, foi a primeira ruptura. Os programas setoriais foram desmontados, as Câmaras Científicas, rapidamente, reestruturadas e direcionadas para uma visão meramente acadêmica e de seus interesses.
Com a volta de Miguel Arraes ao Governo, retorna o grupo original e a instituição é presidida por Lúcia Melo. Busca-se, novamente uma associação com o desenvolvimento e com um projeto em que ciência e tecnologia estão fortemente articulados. Destaque-se os acordos feitos com os cubanos na área de agricultura tropical, primeiro grande esforço internacional.
Duas gestões demonstram como podem ser verificada descontinuidade. Numa delas, interesses de um setor apenas são privilegiados. A complexidade da economia pernambucana não é analisada. Os interesses setoriais superam os do Estado. Vende-se a ideia de que modernização passa exclusivamente por Informática. Como os recursos são bem reduzidos, não há grande disputa, a grande maioria da comunidade acadêmica ignora a Fundação e seu poder de articulação. Há uma dissociação da comunidade acadêmica dos rumos da Fundação.
Tendo sido instrumentalizada, com a distribuição de bolsas para diferentes objetivos que não os que deveriam nortear a Fundação, ou mesmo para funcionários da própria instituição, a gestão do organismo fica problematizada.
Diogo Simões, fez um trabalho muito importante. Teve coragem de enfrentar interesses e fazer retornar os rumos da instituição. Deixou claro que os instrumentos da FACEPE não seriam utilizados em outros interesses que não os que estavam em sua concepção. Neste sentido, com a ajuda do Governador do Estado Eduardo Campos, recuperou o orçamento em patamar bastante superior e conseguiu, em um movimento coordenado com a Secretaria e Comunidade Científica, que a Assembleia Legislativa corrigisse a lei estadual no que tange à alocação orçamentária, dando maior robustez aos trabalhos desenvolvidos. Também, cria-se uma Diretoria para a Área da Inovação, tornando-a prioritária para as novas atividades.
Tendo participado das Câmaras de Ciências Humanas e de Inovação, em diversas gestões, retorno à administração, como Presidente, em 2015.
Duas grandes dificuldades eram postas. Em primeiro lugar as finanças do Estado estavam em grande crise, que se agravou entre 2016 e 2019, quando saio da Presidência, em segundo lugar, o orçamento estava fortemente comprometido com as bolsas, o que levava a críticas constantes.
Com a ajuda do Diretor Científico Prof. Paulo Cunha, conseguimos convencer que o programa de Bolsas era fundamental. O Governo Federal, cada vez mais, ia diminuindo os recursos para este fim, o que poderia levar a uma desestruturação da Pós-graduação do Estado, com um número crescente de programas novos e ainda não consolidados. O Estado manteve o patamar dos programas, seja nos universais, seja nos setoriais priorizados.
Quanto ao orçamento, o trabalho foi incansável. A Secretária de Ciência, Tecnologia e Inovação do Estado Lúcia Melo fazia uma abordagem constante aos diferentes órgãos do Estado responsáveis para a liberação dos recursos. Mesmo em crise, conseguiu-se elevar o patamar de desembolso em alguns anos e dar continuidade às diferentes ações.
Um problema adicional surge no caminho. Pela primeira vez, o Governo Federal exige que um programa da máxima importância, dos grupos de excelência, o dos Institutos Nacionais de Ciência e Tecnologia, tenha contrapartida igual dos Estados. Teria que ser metade federal, metade estadual. Para garantirmos oito projetos e continuarmos na liderança regional do setor, precisaríamos de 17 milhões de reais em 5 anos. Eram recursos adicionais, não previstos, bastante oneroso num período de fortes restrições. O Ceará não aderiu ao programa o que abria um precedente para objeções do Governo Estadual. Após inúmeras reuniões com a Secretaria de CTI, resolvemos que não poderíamos abrir mão. Fomos em busca dos recursos e assumimos o risco, evidentemente contando com a boa vontade dos demais organismos estaduais que acabaram concordando.
Também, a área internacional era um dos principais gargalos. Lançávamos tímidos dois ou três editais por ano. Resolveu-se que deveria ser fortalecida. Criou-se uma assessoria e convidamos a pesquisadora Aronita Rosenblat para coordená-la. Como apoio das demais Fundações do País, em um trabalho articulado, a FACEPE lança, hoje em dia, 16 ou 17 editais anuais, com orçamento significativo.
Outra questão importante a ser tratada era a da regionalização. As ações se concentravam muito na região metropolitana. Com a criação de novos programas, novos cursos de pós-graduação no interior, era fundamental pensar na interiorização. Foram criados critérios específicos que permitiram o espraiamento e a maior participação das diferentes regiões.
Ainda, a área de inovação teria que ser fortalecida. A FINEP, principal parceira, tinha uma retração dos investimentos para o setor. Foi preciso criar programas específicos para Pernambuco e os implementar com recursos próprios. A busca de parcerias foi fundamental.
Um dos objetivos principais da Fundação, articular a comunidade acadêmica com as necessidades do Estado, ficou claro na área de Saúde. Doenças negligenciadas, Zica, chikungunya, dengue, surgiram como problema sério para a saúde pública. Rapidamente, conseguiu-se estruturar ações e programa específico que permitiram dar importante contribuição para minorar os efeitos da endemia. A FACEPE foi a primeira Fundação no Brasil a lançar um programa e alocar recursos.
Fico feliz em ver que esta linha se mantém viva na gestão que nos sucedeu. Foi assim com o problema ambiental da poluição das praias com petróleo, está sendo assim com a pandemia do coronavírus.
Esta seria minha contribuição para que se escreva uma versão da história na qual me identifico.
*Abraham Benzaquen Sicsu, é professor aposentado da UFPE, Ex-Presidente do Instituto Tecnológico de Pernambuco, Ex-Presidente da Fundação de Amparo à Ciência e Tecnologia do Estado de Pernambuco (FACEPE) e Acadêmico da APC.