ACADEMIA PERNAMBUCANA DE CIÊNCIAS (APC) EM DEFESA DA UNIVERSIDADE, DA LIBERDADE DE EXPRESSÃO E DA VIDA

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Atualmente, o Brasil está atravessando o momento mais difícil da sua história, pois chegou a acusar a maior taxa de mortalidade diária em todo o mundo decorrente da pandemia da Covid-19. Os números diários de óbitos são aterrorizantes com a média móvel de óbitos em 14 dias batendo recorde pelo 160 dia seguido. Ao mesmo tempo, fatos estarrecedores como negacionismo científico, desastres ambientais, justiça questionada, cerceamento da liberdade de expressão e ataque frontal à autonomia universitária, tornaram-se regra no atual governo.

Na Declaração Universal dos Direitos Humanos, adotada e proclamada pela Assembleia Geral das Nações Unidas por meio da resolução 217 AIII, de 10 de dezembro de 1948, (https://www.unicef.org/brazil/declaracao-universal-dos-direitos-humanos) em seus artigos 18 e 19 fica explícito que “todo ser humano tem direito à liberdade de pensamento, consciência e religião… etodo ser humano tem direito à liberdade de opinião e expressão; esse direito inclui a liberdade de, sem interferência, ter opiniões e de procurar, receber e transmitir informações e ideias por quaisquer meios e independentemente de fronteiras”.

Na Constituição brasileira de 1988, em seu artigo 5o, incisos IV e IX está assegurado que “é livre a manifestação de pensamento, sendo vedado o anonimato e é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença;

O artigo 207 da Constituição, incluído na Emenda Constitucional no 11, de 1996, define que: “As universidades gozam de autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial, e obedecerão ao princípio de indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão”.

Ressaltar estes artigos poderia parecer inócuo ou desnecessário em qualquer País que respeita a Declaração Universal dos Direitos Humanos e sua própria Constituição. Como, infelizmente, não é o caso atual do Brasil, enfatizá-los se torna importante porque o desconhecimento deles por partes de alguns governantes está tornando o País em um “outlier negativo” ou “ponto marginal negativo” no gerenciamento da pandemia da Covid-19 e que além disto, considera a instituição Universidade um potencial inimigo.

No Ofício Circular no 4 de 07/02/2021, o Ministério da Educação se reportava à Medida Provisória Federal – MPF no 133/2019, tentando cercear a liberdade de expressão dentro das Universidades, porém, mesmo sendo revogada por pressão política, não foi suficiente para que o governo desistisse de atacar frontalmente a liberdade de expressão nas Universidades brasileiras. Recentemente, foram impostos TACs (Termos de Ajustes de Conduta) e oitivas na Polícia Federal a docentes que resolveram manifestar publicamente suas divergências a atitudes contra as Instituições Federais de Ensino Superior (IFES) por parte do governo. Isto significa violação dos direitos humanos e da nossa Carta Magna.

O caráter fortemente antidemocrático do atual Governo Federal se expressa também na não aceitação dos resultados das eleições para Reitor das Universidades e Institutos Federais de Educação (IFEs). É fato que Reitores escolhidos democraticamente e corroborados pelos Conselhos Universitários não foram nomeados e preteridos em favor de nomes considerados aliados políticos da presidência. Entre 2002 e 2016, a autonomia universitária neste setor foi mantida e todos os Reitores escolhidos em suas comunidades assumiram seus cargos independente de seus posicionamentos políticos. A autonomia universitária foi considerada em sua plenitude.

Todavia, é muito importante lembrar que em épocas anteriores a democracia universitária não foi respeitada e reitores democraticamente eleitos não foram nomeados a exemplo da Universidade Federal Rural de Pernambuco e da Universidade Federal do Rio de Janeiro, entre outras. A solução está na aprovação pelo Congresso Nacional de uma legislação que garanta a nomeação pelo Presidente do nome escolhido pela comunidade universitária.

Vale salientar que é nas IFES que se produz em torno de 95% de ciência, tecnologia e inovação no País. Entretanto, o Presidente da República vetou recentemente partes da Lei Complementar no 177, aprovada em 12/01/2021, reguladora de recursos para o Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT) que fomenta infraestruturas para pesquisas científicas básicas e aplicadas, essenciais para o desenvolvimento do País. Caso os vetos não sejam derrubados, aproximadamente cinco bilhões de reais deixarão de ser investidos em CT&I este ano. Injustificável, e mostra a falta de visão do atual governo.*

Países que possuem governantes que apoiam suas Universidades estão entre os mais desenvolvidos. O Brasil por outro lado segue em direção oposta e isto tem se refletido na condução da pandemia da Covid-19. Foi na Fiocruz que ocorreu pela primeira vez o sequenciamento genético do vírus SARS-CoV-2, no entanto, é no nosso país onde ocorre talvez o pior gerenciamento da pandemia no mundo. Os números mostram esta triste realidade.

Se o governo agisse em parceria com as IFES e as suas instituições de pesquisa, investindo em pesquisas no desenvolvimento de vacinas e considerando as recomendações científicas, certamente, a situação seria outra e o Brasil não estaria batendo recordes de número de óbitos diários, e muito menos estaria indo de encontro à ciência e nem defendendo um sistema econômico ineficiente, pois o Brasil que era sétimo lugar na economia mundial, atualmente se encontra no décimo segundo lugar.

Desta forma, a Academia Pernambucana de Ciências vem se juntar a inúmeras Associações e Sociedades científicas defensoras da educação, ciência e tecnologia como propulsoras do desenvolvimento sustentável econômico, ambiental e social, protestando contra medidas injustificáveis do atual governo, pois o Brasil jamais resolverá seus problemas sem educação, ciência e tecnologia como prioridades.

Mas, neste momento do primeiro registro definitivo de uma vacina contra a Covid-19 no País, a APC parabeniza a administração, cientistas e técnicos da FIOCRUZ por este marco histórico, bem como ao Butantã, as IFES, institutos de pesquisa e os servidores da Saúde pela dedicação na produção de conhecimento e aplicação para salvamento de vidas.

José Antônio Aleixo da Silva

Presidente da APC

  • Esta matéria foi publicada no dia 15 de março. O Congresso Nacional derrubou os vetos do presidente do dia 17 de março, uma vitória para C&T do Brasil.