O TEMPLO DA PERNAMBUCANIDADE MÉDICA

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Gilson Edmar Gonçalves e Silva (APC, cadeira #12), Raul Manhães de Castro(APC, cadeira #35) e Maria de Fátima Militão (APC, cadeira #93)

O atual Memorial da Medicina é considerado o templo da história da Medicina pernambucana. Foi concebido e edificado para ser a sede da primeira Faculdade de Medicina em nosso Estado, criada poucos anos antes por Dr. Otávio de Freitas (1871- 1949). O projeto foi de autoria do arquiteto italiano Giacomo Palumbo. O término da obra se deu em 27 de março de 1927, sua inauguração data de 21 de abril do mesmo ano. Na época, seus espaços foram adequados a uma escola médica. Sua função histórica e sua bela arquitetura do início do século XX, motivou seu tombamento como um patrimônio pernambucano. A edificação é um dos raros exemplares significativos da arquitetura neocolonial na cidade do Recife. A construção possui um pátio interno, similar aos claustros dos conventos e mosteiros, apresenta galerias circundantes no térreo e no primeiro pavimento. Os seus salões espaçosos circundam o edifício e tem amplas janelas para o exterior. No grande saguão, destaca-se uma magnífica escadaria. Na retaguarda do Memorial, também tombado, por ser um exemplo de um estilo arquitetural modernista, localiza-se outra edificação de menor porte, a qual abrigou o Serviço de Verificação de Óbitos e, onde hoje funciona a sede do Instituto dos Arquitetos do Brasil-PE. 

Após a passagem da Faculdade de Medicina para a Cidade Universitária, o prédio foi cedido ao Exército que instalou nele o Colégio Militar. A obstinação do Dr. Fernando Figueira (1919-2003) acarretou a devolução da edificação histórica pelo o Exército à UFPE, tendo o referido professor instalado no local a Academia Pernambucana de Medicina, por ele criada e atualmente presidida pelo Prof. Dr. Hildo Cirne de Azevedo Filho, um dos grandes neurocirurgiões brasileiros com projeção mundial. Em seguida, outras entidades médicas também foram ocupando seus espaços, para que o prédio viesse a cumprir seu papel histórico de berço da medicina pernambucana. Além da Academia Pernambucana de Medicina, com papel destacado de propagar o saber médico, tem considerável relevância no Memorial o Museu da Medicina, a Sociedade Brasileira dos Médicos Escritores, a Sociedade de Pesquisa e Estudos da Terceira Idade, o Instituto Pernambucano de História da Medicina, a Sociedade dos ex-alunos da Faculdade de Medicina e a Academia de Artes e Letras de Pernambuco. Durante algum tempo, boa parte das dependências foi cedida à COVEST, que se encontra em fase de transferência para outro local.

Na gestão do Dr. Luiz Barreto na Coordenação do Memorial da Medicina, aquele espaço cultural ganhou vida, com numerosas reuniões científicas e com a ampliação do Museu, criação do Dr. Leduar de Assis Rocha e consolidado por Dr. José Falcão, Presidente do Instituto da História da Medicina. As primeiras imagens que se destacam quando se visita uma cidade, são os seus prédios ou as construções que de alguma forma representem ou trazem em suas características pistas sobre a história da localidade visitada e de seus habitantes. O Memorial, esse patrimônio histórico arquitetônico, representa parte substantiva da história da cidade do Recife, do estado de Pernambuco e também do Brasil. Assim, há no prédio um enorme e extraordinário acervo museológico, com cerca de 5000 peças e é frequentemente visitado por seus admiradores, provenientes de todo País. Outrossim, vale a pena informar que um valioso acervo ainda se encontra no Centro de Ciências da Saúde (CCS), que sucedeu à Faculdade de Medicina, após a reforma universitária. Sob a Direção do Dr. Gilson Edmar Gonçalves no CCS, houve uma rigorosa triagem de documentos e peças que contribuiram para completar a nossa história médica. Por conseguinte, esse material deve voltar à sua origem, o Memorial da Medicina. Entre eles está o bureau do primeiro Diretor da Faculdade de Medicina do Recife, o Prof. Dr. Otávio de Freitas. 

O Memorial da Medicina, uma instituição da Universidade Federal de Pernambuco, há alguns anos atrás, passou para sua tutela da Pró-Reitoria de Extensão. Desde o reitorado anterior houve início a reuniões, com o objetivo de regularizar o funcionamento das entidades lá abrigadas. Neste reitorado as reuniões foram bem produtivas, numa tentativa de conciliar os interesses e respeitando as determinações legais. Contudo, não havíamos ainda chegado a um acordo final, quando fomos surpreendidos por um ofício do Pró-Reitor de Extensão nos cobrando um aluguel pelas áreas, acompanhado da ameaça de despejo, caso não fosse pago num prazo estipulado. Evidentemente, ambos o aluguel e a ameaça de despejo foram decisões unilaterais, em desacordo total com as reuniões anteriores, cujas decisões se faziam sempre de modo consensual. É muito relevante esclarecer que o pagamento pelo espaço ocupado não necessariamente deva ser apenas como aluguel, pois as Instituições que ocupam o Memorial não têm características comerciais. São Associações Acadêmicas, que podem retribuir com atividades científicas de ensino e pesquisa, direcionadas para a Faculdade de Medicina da UFPE, atendendo, assim, às exigências legais. Poderíamos, como exemplo, oferecer atividades acadêmicas de ensino, pesquisa e extensão sobre a história da Medicina pernambucana e brasileira. O Museu da Medicina já é campo de prática do Curso de Museologia da nossa UFPE. Assim, vem sendo exercido também o papel transdisciplinar, em consonância com a missão da Universidade. Nas várias reuniões ocorridas, pleiteamos que a Reitoria da UFPE promovesse uma reforma restauradora no prédio, além de adaptá-lo para ser local de eventos científicos de pequeno e médio porte. Estas medidas poderiam atrair recursos para manutenção e investimentos, atendendo às necessidades financeiras solicitadas. Ainda não obtivemos resposta até o momento. O Memorial da Medicina poderia, deste modo, e doravante, melhor cumprir seu papel de guardião da história da medicina pernambucana, cuja nobre missão os Médicos, as Entidades Médicas e a Sociedade não deixarão que seja interrompida, nem profanada.

A história consagra a importância dos médicos pernambucanos no País. Pernambuco foi, é, e continuará a ser uma fonte muito importante de ilustres médicos, a começar pelo Barão de Goiana, Dr. Jose Correia Picanço (1745-1823). Este é o verdadeiro fundador das escolas médicas no Brasil. Este pernambucano, nascido na vila de Goiana, formou-se doutor em Medicina na Universidade de Paris, tornando-se lente da Universidade de Coimbra. É importante citar aqui novamente o Dr. Jose Otavio de Freitas, foi o fundador da nossa centenária Faculdade de Medicina. Ele que também criou o “Jornal de Medicina de Pernambuco”, em 1925, o Instituto Pernambucano de História da Medicina, em 1926; construiu o Dispensário de Tuberculose, inaugurando-o em 1937; presidiu a Liga de Higiene Mental de Pernambuco (1946-1947); e foi um dos fundadores da Sociedade de Higiene de Pernambuco, em 1947. Todos sabem por exemplo o papel fundamental no Brasil de médicos pernambucanos como Nelson Chaves, Josué de Castro, Naide Teodósio, Bertoldo Kruse, Malaquias Batista no que concerne a problemática da fome no Brasil e no mundo. Há também outros eminentes médicos que fizeram história em Pernambuco, constituintes de uma lista infindável que por óbvias razões não enumeraremos aqui. Assim, a preservação de monumentos histórico-culturais da medicina no Estado significa a manutenção da própria memória sociocultural do nosso estado e do Brasil. 

A sociedade pernambucana, entre ela nós médicos de Pernambuco, estaremos todos juntos e vigilantes na luta pela preservação deste patrimônio, berço da nossa respeitada Medicina, reconhecida no Brasil e no Exterior. O Memorial da Medicina é templo sagrado de todos os Médicos de Pernambuco. Sim! O Memorial da Medicina é o templo da pernambucanidade médica!

*Gilson Edmar Gonçalves e Silva, médico, Prof. da UFPE, membro das Academias Pernambucanas de Ciências e de Medicina

**Raul Manhães de Castro, médico, Professor da UFPE e membro da Academia Pernambucana de Ciências.

***Maria de Fátima Militão, médica, Profa. da UFPE, membro das Academias Pernambucanas de Ciências e de Medicina